19 de novembro de 2014

olhe, de forma simples, eu sou a maior!

Tenho ido a várias entrevistas de emprego. Podia começar aqui a contar as minhas aventuras mas algumas são tão tristes que não merecem que gaste as teclas e outras são mais do mesmo: depois ligamos, para a semana damos notícias, vamos avaliar o seu perfil, recebemos mais quinhentos currículos para além do seu. Um mar de desculpas e justificações de quem demora meses a dizer que pede perdão, deseja o maior sucesso mas apareceu alguém mais competente.
Mas este processo todo (muito complicado, por sinal) começa antes do dia em que acordo cedo e vou gastar dinheiro num autocarro qualquer para estar quinze minutos à conversa. 
É preciso enviar o cv, a versão mais actualizada do 'eu' resumida apenas a uma página - é importante não encher as empresas de informações pouco relevantes, ter cuidado com as palavras, arranjar um design à altura daquilo que queremos transmitir e confirmar dez vezes os possíveis erros ortográficos. Depois, quando pedem, é preciso passar à carta de motivação ou de apresentação ou do raio que lhe queiram chamar. Pedem-nos, outra vez, que usemos a capacidade de síntese que devia ter sido adquirida no ensino básico para falarmos sobre nós. Aqui, a porca torce o rabo. Mesmo para quem é bom com palavras não existe exercício mais ingrato que o de falar de nós. Chega a ser uma atitude narcisista, idiota e completamente inútil. Ao fim de dez ou vinte empresas já ninguém está motivado para escrever uma carta que pretende motivar. Motivar quem? pois não sei. Motivar alguém a acreditar em nós. Usam-se os adjectivos mais impressionantes de sempre. Em dez ou vinte linhas temos que ser (ou parecer) os maiores. Há coisas que são cliché: trabalha-se bem em equipa, capacidade de comunicação, falamos inglês e damos uns toques no espanhol, empenhados, pontuais e disponíveis para aprender (mesmo que não nos queiram ensinar). Queremos ser os melhores, crescer na área, ganhar portefólio e experiência. 
De repente, lá estamos nós. Sentados numa sala ampla com paredes brancas, numa cadeira mais ou menos confortável à espera da nossa sentença. Esperamos pelo responsável da área e pelo dos recursos humanos, respondemos a umas questões. Quem somos, onde estamos, para onde queremos ir. Porquê aquela oferta, porquê aquele emprego, porquê aquela empresa. No fim, a derradeira: porquê nós. O que nos diferencia, o que temos para dar, os nossos pontos fortes e os pontos fracos. Muitas perguntas, poucas respostas certeiras. Tentamos mostrar confiança mas tiram-nos o tapete dos pés quando falamos do que já fizemos na vida. Alguma coisa, não tanto quanto os outros 490 que enviaram o currículo.
despedem-se de nós, apertam-se as mãos e ouve-se o mesmo até ao final da próxima semana damos resposta, temos urgência. Desconfio que a urgência se perde pelo caminho ou então acontecem sempre imprevistos. 
A história repete-se. E não me podendo queixar porque, ao que parece, os novos não o podem fazer, sai-se de cabeça baixa e começa a pensar-se em soluções. Afinal, tudo tem uma. Não é?

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